segunda-feira, 19 de maio de 2008

Luís Felipe Borges Há poucos conceitos "originais" na TV portuguesa

Conhecido por muitos como ‘o gajo da boina’, Luís Felipe Borges, apesar de novo, possui já um currículo invejável, tanto em rádio, teatro, escrita como na televisão. A boina, da qual não prescinde, é uma maneira de se distinguir, pois gosta de ser diferente.
“A Revolta dos Pasteis de Nata”, doce que não aprecia, foi um programa de enorme sucesso, no qual entrevistou inúmeras figuras de diversas áreas a nível nacional, sempre com um toque de humor e boa disposição.
A Stand Up Comedy foi o motivo que, desta vez, o trouxe a São Miguel.

O teatro, a escrita, a rádio e a televisão já foram todas partes integrantes da sua vida. Programas como Zapping e A Revolta dos Pasteis de Nata, ambos transmitidos pela RTP2, foram alguns dos projectos que gostou mais de desenvolver. Felipe Borges é um açoriano que, mesmo estando longe, não esquece e orgulha-se das suas raízes.

T.N.- Fale-nos de si

L.F.B. - Sou um orgulhoso açoriano de 30 anos, natural de Angra do Heroísmo, que se licenciou em Direito para fazer a vontade aos pais, mas que sempre sonhou viver da escrita. A fantasia impossível, já agora, era ter sido guarda-redes do Benfica!

T.N. - Como e quando se iniciou no mundo da televisão?

L.F.B.- Considero essa etapa da minha vida como um feliz acidente. Há pouco mais de 3 anos atrás, escrevia uma crónica diária de humor sobre a actualidade para o extinto diário “A Capital”. Um belo dia, e para meu total espanto, ligou-me o sub-director de programas da RTP2 a dizer que gostava muito desses textos e que gostaria de me conhecer, pois o canal tinha um projecto onde eu poderia encaixar bem. Foi uma espécie de “american dream” à portuguesa. Conhecemo-nos, demo-nos muito bem, gravei um “piloto” e a aventura começou.

T.N. - Fale-nos sobre a Stand Up Comedy e diga-nos como surgiu a oportunidade de visitar os Açores?

L.F.B.- O Teatro Micaelense contactou as Produções Fictícias no intuito de combinar uma parceria e, no âmbito dessa colaboração e como associado da empresa, fui desafiado a vir. E como nunca desperdiço uma oportunidade de regressar às ilhas, cá estou… com muito prazer! Ainda por cima considero-me um açoriano especial, porque nasci na Terceira, mas fui fabricado em São Miguel, numa noite - certamente escaldante – que os meus pais tiveram nas Furnas, quando ambos leccionavam na ilha verde. Adoro São Miguel, tenho vários amigos cá, não podia faltar!

T.N.- Faça-nos um balanço da sua carreira.

L.F.B.- ‘Carreira’ é uma palavra que me assusta um pouco, pois ainda me vejo como um miúdo. De qualquer modo, diria que estou imensamente feliz com a “estrelinha” que tenho tido e considero-me um privilegiado por me ter sido concedida a graça de viver, trabalhando no que mais gosto e nas áreas que sempre desejei. O meu avô paterno, que era agricultor, deu-me uma vez um conselho: “Arranja uma coisa que gostes de fazer e nunca mais trabalhes na vida”. Sinto que isso aconteceu.

T.N.- Tendo em conta as áreas da escrita, teatro, rádio e televisão, qual a que o fascina mais? porquê?

L.F.B.- Todas são aliciantes desafios e campos de imenso interesse, mas a minha predilecção foi desde sempre para a escrita. Talvez, porque sou tímido e a escrita é uma área onde muitas vezes só dependemos de nós próprios e podemos ficar no nosso cantinho, sem incomodar ninguém.

T.N. - Qual ou quais o (s) projecto(s) que lhe deu mais prazer até hoje?

L.F.B.-
Top 5, ex-aequo: Zapping (programa de TV, RTP2), Stand-Up Tragedy (espectáculo de teatro); A Revolta dos Pastéis de Nata (RTP2); Sit-Down Comedy (crónica, A Capital); Portugal Revisto e Aumentado (crónica, semanário SOL).

T.N.- O que é a televisão para si?

L.F.B.- Apenas mais uma entre várias áreas que me apaixonam e que têm em comum o estarem integradas na comunidade da Comunicação.

T.N.- Qual a sua opinião sobre a situação da televisão em Portugal?


L.F.B.- Não muito positiva, infelizmente, por duas razões: primeiro porque, ironicamente, vejo pouquíssima TV. Sou viciado em livros e DVD’s, ou seja, acabo por só ver as séries que quero e quando quero (e os jogos do Glorioso, claro). Em segundo lugar, e por causa da primeira razão, porque há muitos anos que é raríssimo verem-se conceitos originais na TV portuguesa. A esmagadora maioria dos formatos são copiados de fora e há uma espécie de pavor em arriscar. Isto desmotiva-me profundamente enquanto telespectador. Mas claro que há pessoas com quem adoraria trabalhar, a começar pelo “nosso” Zeca Medeiros.

T.N.- Já sei que não gosta de pastéis de nata, mas "A Revolta dos Pasteis de Nata" foi um êxito. O que nos pode dizer sobre o programa e como surgiu a ideia?

LFB- Antes de mais, muito obrigado! A RTP2 tinha o projecto (e o enorme mérito) de querer criar um programa em directo, de entretenimento, debruçado sobre Portugal e com uma equipa de caras desconhecidas. Uma grande e ousada aposta, portanto. Várias produtoras concorreram e a Videomedia ficou com o projecto. Fui seleccionado directamente pelo canal, houve química imediata com as pessoas da produtora e começámos a definir em conjunto os detalhes do que viria a ser o programa. Gostávamos da dinâmica e irreverência conotadas com a palavra “Revolta” – e essa foi a primeira a surgir. “Pastéis de Nata” foi uma ideia posterior, porque queríamos ter um símbolo português no nome e alguém se lembrou de que o pastel de nata é um bolo tipicamente português (em Inglaterra chama-se, por exemplo, “portuguese pie”). Sabíamos que um nome desses seria marcante, sugestivo e irónico. Depois lançámo-nos ao desafio com unhas e dentes, mas também com muita descontracção. Pessoalmente, julgo que me ajudou o facto de não estar minimamente preocupado com um futuro na TV (pois os meus planos e a minha vida eram outros). Assim, acabei por encarar cada directo sempre sem medos e talvez como um surfista que não pensa em mais nada, senão curtir a magnífica onda que acaba de apanhar.

T.N. -Qual o papel dos Açores na sua vida?

LFB.- Um papel vital, pois sinto o orgulho e a honra de ser natural da zona mais bonita do país e porque a condição de ilhéu influencia a minha maneira de ser e mesmo de trabalhar. Por ser açoriano não temo a solidão e, graças às ilhas, sinto que – por muito deprimido que esteja – tenho sempre um local ao qual chamar “casa” para me refugiar. Além disso, ter nascido a 1500 kms da capital faz-me relativizar tudo e não dar demasiada importância nem aos êxitos nem aos fracassos.

T.N.- Que papel ocupa o trabalho na sua vida?

LFB.- Um papel muito preponderante, mas simultaneamente muito saudável, pois, como já referi antes, o meu trabalho é um prazer: realiza-me constantemente – logo, é difícil e raro passar mais de 24 horas seguidas aborrecido.

T.N.- "Quando uma relação acaba, acaba tudo. Nunca haverá amizade entre duas pessoas que recordam constantemente uma à outra que falharam". Porquê e em que contexto surgiu esta afirmação?

LFB - Salvo erro, é uma citação de uma crónica na TABU, revista do SOL. Surgiu por crença, porque não acredito de todo que um casal de ex-namorados – que tenham estado seriamente empenhados durante a relação – possam continuar sinceramente “amigos” depois… e o contexto, bem, era autobiográfico.

T.N.- Projectos?

Manter as minhas crónicas no SOL e na MAXMEN, não lixar o novo filme do Leonel Vieira com o meu “cameo”, nem o documentário do Vicente Jorge Silva sobre o arquipélago com a minha participação; no Verão gravarei um pequeno papel na nova produção do Alexandre Valente (filme realizado pelo Nicolau Breyner) e, em Setembro, voltarei à antena do RCP, estarei a leccionar um workshop de escrita criativa durante 3 meses na Guilherme Cossoul em Lisboa e - quem sabe? – a iniciar a 3ª série do SEMPRE EM PÉ.

T.N.- Quais seriam para si, os projectos ideais na área da televisão?

O meu sonho é um dia poder conduzir um programa à imagem e semelhança do “Daily Show with Jon Stewart”. Mas confesso que tenho um fraquinho por concursos… se um dia pudesse apresentar algo no género do “Quem Quer Ser Milionário?”, tenho a certeza de que me divertiria imenso! Mas objectivos, mesmo, passam por publicar um romance e escrever e realizar uma longa-metragem. Ah, e o maior de todos: ser pai. Objectivo, sonho e desejo que já esteve bem mais longe de acontecer…

Biografia e percurso profissional

Foi criativo nas "Produções Fictícias", desenvolvendo experiências na publicidade, na rádio e no teatro, mas tornou-se mais conhecido do grande público com o programa semanal emitido pela RTP2, A Revolta dos Pasteis de Nata, onde juntou personalidades tão distintas como Maria José Morgado, José Monchique, Luís Represas, João Soares ou Joaquim de Almeida, sempre numa base de humor.
“Depois dos convidados se sentarem, com o directo no ar, só tenho de os fazer sentir confortáveis e passar energia positiva. O que não é complicado, uma vez que adoro este trabalho".
Já há quem o distinga como o "gajo da boina". De facto este adereço colou-se a Luís Filipe Borges, logo que chegou à capital. Desde então, adoptou-o como uma imagem de marca. "Estava há poucas semanas na capital e sentia-me chocado com os meus colegas em Direito. Todos iguais, sem alma, sem carisma, muitos já de blazer e pastinha… Comecei a usar boina pela simples razão de que pretendia distinguir-me na multidão da faculdade." Porém, é essa mesma boina que esconde paradoxalmente uma personalidade introspectiva e tímida, pois considera-se um “tímido e individualista por natureza”, daí que se sinta sempre “mais à vontade de noite, à frente do pc, a escrever”. Apesar de estar, hoje, à frente das câmaras, o açoriano não tem dúvidas que o seu percurso natural é a escrita. "Antes da «Revolta» já tinha atingido o objectivo de ganhar o seu sustento pela escrita, fosse como argumentista, cronista ou dramaturgo, há mais de 4 anos e crê que esse será sempre o seu caminho natural, pois a TV foi mais um “acidente” de percurso.
Nascido em Angra do Heroísmo, a 5 de Agosto de 1977, Luís Filipe Borges iniciou na Terceira o seu trajecto académico que concluiu em Lisboa, com a licenciatura em Direito, pela Universidade Clássica de Lisboa.
A inclinação para a escrita depressa surgiu em concursos e participações na imprensa e rádio locais. A carreira na televisão, começou como criativo/actor, em programas como "Zapping", "Fenómeno", "Serviço Público", todos na RTP2, atingindo maior notoriedade como associado das Produções Fictícias. Foi ainda um dos argumentistas do programa da RTP1, "Portugal FM".
Passou pela imprensa nacional, colaborando com "Correio da Manhã", "Record" e com "A Bola", chegando a redactor do "Inimigo Público", um suplemento de humor do jornal "Público" e a autor da crónica diária "Sit-Down Comedy", no jornal "A Capital". Colabora também com as revistas "Maxmen" e com o semanário "SOL".
No teatro, fez adaptações, encenou, representou, mas foi sobretudo autor. Peças como "O Café do Fim do Mundo", "O Espírito de Natal", "Não Há Crise", "Fechado para Férias", "Urgências" tiveram a sua assinatura, bem como o espectáculo "Stand-Up Tragedy", com Nuno Costa Santos.

Raquel Moreira
Public in Terra Nostra, Maiop de 2008.




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