segunda-feira, 19 de maio de 2008

Prevenir com as terras do "Eu"

Eulândia: Projecto de Educação Psicossexual

A ilha dos Sentimentos, a dos Valores, a dos Outros e muitas outras mais, é o que as crianças podem encontrar, viajando de barco pelas terras do ‘Eu’. Uma viagem divertida, em que se transformam em piratas à descoberta de vários tesouros e onde, num clima de descontracção, são abordadas nove temáticas, como as nove ilhas dos Açores, fundamentais ao desenvolvimento saudável da criança, tanto a nível físico como psicológico. Através de uma aventura divertida e diferente, as crianças são esclarecidas e alertadas para situações que podem ocorrer no dia-a-dia como, se devem, ou não, falar com estranhos.
A iniciativa de integrar o tema da Educação Psicossexual nas escolas, partiu da Direcção Regional de Educação, tendo este projecto nascido pelas mãos das empenhadas psicólogas Carina Carmo e Tânia Ramos da EBI Canto da Maia.

Por mais que tentemos evitar, as crianças estão cada vez mais expostas a vários perigos. Como é impossível fechá-las ao mundo, o que lhes seria profundamente prejudicial, há que fazer vê-as como se podem defender em várias situações do dia-a-dia. O projecto Eulândia contribui em grande parte para este objectivo, além, de que desenvolve o ‘Eu’ de cada uma delas, tornando-as crianças mais sãs a nível físico e psicológico.
Carina Carmo, psicóloga do serviço de Psicologia e Orientação da Escola Básica e Integrada Canto da Maia, começa por dizer que a Eulândia é um projecto “inovador de Educação Psicossexual, inspirado nos Açores e no qual as crianças percorrem todas as ilhas”. Estas equivalem a “nove sessões/temáticas que defendemos e que são essenciais a neste tipo de projectos e destinam-se a crianças do ensino pré-escolar e do primeiro ciclo do ensino básico. A Eulândia, no fundo, é um mundo a descobrir, são as terras do ‘Eu’, que é importante a criança visitar e conhecer, para se fazer uma boa construção de personalidade, onde se integra precisamente a sexualidade”- esclarece.
Avança também que pretendiam construir uma “aventura”, para que o projecto fosse “interessante e inovador”, não querendo, “de modo algum, impor” algo ainda mais desagradável e mais um cargo curricular. Por isso, escolheram “actividades muito fáceis”, que permitem, a seu ver, uma “transversalidade” a nível das actividades curriculares adequadas ao nível das crianças da pré-escolar, do primeiro, segundo, terceiro e quarto ano. Foi interessante, afirma satisfeita, salientando que, no fundo, fizeram o que costumam fazer como psicólogas, puseram-se “no lugar do outro, tentamos ser crianças um bocadinho também e pensar como uma criança poderia gostar de viver esta experiência”.
“Foi assim que nasceu o nosso arquipélago da Eulândia, que tem a ver com a descoberta do ‘Eu’. Uma das áreas do Eu está intimamente ligada com a sexualidade, uma forma de expressão, onde a criança desenvolve a sua personalidade”.
A iniciativa, revela, partiu da Direcção Regional de Educação, pois houve uma orientação de que “todas as escolas tinham de apresentar o seu projecto de Educação Sexual e para os Afectos ” até ao final do ano lectivo. Acrescenta ainda que o Conselho Executivo da EBI Canto da Maia pediu o suporte do serviço de psicologia e orientação, “não para inventar as actividades, mas para criar um fio condutor de desenvolvimento do que achamos que se deve integrar, numa perspectiva de formação da personalidade da criança”. Neste sentido, o serviço de psicologia desenhou este projecto, criando o tal “fio condutor desenvolvimento mental”.
A psicóloga afirma também que o objectivo central está relacionado com a “promoção da saúde no contexto escolar”, tendo ambas, partido desde aspectos mais centrados no próprio desenvolvimento do ‘Eu’ até aspectos mais sociais, relacionados com os valores.
“Os objectivos têm a ver com saber fazer, ter conhecimentos, treinar competências e viver experiências”- ressalva, reconhecendo que, no fundo, o projecto pretende ajudar a criança a “crescer com a máxima normalidade” nesta área e, por outro lado, “ajudar os educadores e professores a ter um fio condutor” de como é possível realizar este tipo de projectos.
O projecto, continua, iniciou-se com uma “experiência piloto” em duas turmas da Escola Canto da Maia, “uma do pré-escolar e outra do quarto ano”, pois precisavam de “ver no terreno se o projecto resultava e se as actividades estariam ajustadas aos objectivos, se haveria algo a reformular antes de o realizar em toda a comunidade educativa”.
Carina Carmo explica que, depois de uma fase de aprovação do projecto, de “sensibilização aos professores e das sessões zero, nas quais os pais participam, este é ampliado a todos os alunos”.
Saber dizer “não”, é outro dos objectivos do projecto. “Quando fizemos este projecto, levamos a cabo uma extensa investigação bibliográfica”- realça, admitindo não se poder fazer este tipo de projecto sem pensar na “prevenção dos abusos sexuais, tema de que já se fala muito”. Além disso, lembra ainda que se estamos a falar de idades tão “precoces, faz sentido valorizar uma competência que é a assertividade, a capacidade de dizermos “Não”, sem ferir o outro”, pois nas experiências práticas que tiveram com as crianças, verificaram que estas, muitas vezes, se sentiam muito “desconfortáveis” em dizer que não. O que, na sua opinião, se deve ao receio de que “não gostem dela ou digam que esta é malcriada”.
“O saber dizer “Não” é um dos objectivos integrados na ilha das palavras. Da mesma forma que normalizamos outras áreas em cada ilha, a ilha das palavras tem a ver com isso, com o saber dizer “Não” ou “Sim”, em que situações é ajustado, legitimar a criança a saber dizer que não e como o pode fazer”.
Referindo-se à importância da Eulândia em termos de jovens saudáveis no futuro, a psicóloga avança acreditar que este projecto pode ajudar a “diminuir alguns comportamentos problemáticos, pois não se limita à simples divulgação de informação, mas permite desenvolver experiências”.
Avança, também, que a partir do momento em que as crianças estão na ilha dos Sentimentos, na qual é possível “normalizar sentimentos ou na ilha dos Outros, onde valorizamos a amizade, aprendem competências e a dar elogios aos outros”, áreas que considera “fundamentais” e que poderão permitir, a “substituição de alguns comportamentos disfuncionais por outros mais adaptativos”.
Dirigindo-se à sociedade, Carina Carmo aproveita para fazer um apelo, dizendo que, “normalmente, esta é uma área a que as pessoas só prestam atenção quando o problema já está instalado e às vezes não se pensa na prevenção primária, nem em como podemos contribuir”-salienta, afirmando não ser uma “linha directa”, não ser “causal”. Reconhece ainda, não ter “resultados a 100%”, o que seria “óptimo, mas o objectivo concorre e poderá ajudar”. Logicamente, lembra, há muitas variáveis que fazem uma criança ter bem-estar psicológico e “o projecto não vai controlar todas”, mas, “com certeza, que é uma mais-valia para as crianças terem um desenvolvimento harmonioso” do ponto de vista psicológico.
Outra questão abordada é a gestão da violência. “Se eu sentir que é normal sentir-me triste e não achar que a culpa é minha, mais provavelmente vou conseguir falar sobre isso”. Afirma também ser necessário que os adultos estejam preparados, “não em fazer uma técnica de ‘saca-rolhas’ com os sentimentos da criança, mas no sentido de dar exemplo de que temos sentimentos e devemos falar acerca deles”.
Muitas vezes, na criação das fantasias e dos medos a criança parte de situações, em que “não percebe” o que está a acontecer. “Podemos não dizer nada, mas elas percebem pelas nossas expressões, como nos sentimos. Podemos estar cansados e a criança achar que estamos tristes”-enfatiza, classificando a Eulândia como uma “alavanca para professores, pais e outros adultos conseguirem falar das suas emoções”.
Se a criança consegue falar das suas emoções mais facilmente é capaz de as normalizar e de “pedir ajuda de uma forma diferente”, em vez de as descarregar de forma negativa, pois se ela estiver “desmotivada e triste”, pode traduzir isto num “comportamento violento, pois não consegue gerir os seus sentimentos”. Por outro lado, as ilhas também permitem aos educadores “detectarem” situações mais complexas, que pedem a intervenção de outras pessoas.
A psicóloga esclarece também que, ao longo do projecto, se um educador detecta comportamentos menos ‘normais’ originados por questões familiares, tem inicio um processo “independente” do projecto.
“Sempre que um educador encontra um comportamento alarme pode falar com o serviço de psicologia e orientação, no sentido de saber como deve lidar com a situação e, “provavelmente junto com os pais”, analisam a situação e fazem uma avaliação de diagnóstico.
A Eulândia vai incentivar a que se dê mais importância à “prevenção primária”, pois muitas vezes acabamos por funcionar “apenas a nível ‘remediativo’”. “Acredito muito neste projecto”.
“Vemos estes projectos como um reflexo, de como um psicólogo deve agir na área da educação e sentimos muitas vezes, que as nossas prioridades têm de estar em torno da avaliação psicológica e do acompanhamento dos alunos. É um objectivo e uma grande preocupação nossa desde há muito tempo, evitar que ocorram situações problemáticas de abuso” - salienta, avançando que tanto a Eulândia como os encontros entre educadores, pais e professores são “oportunidades de treinar competências, que muitas vezes são desvalorizadas, porque as pessoas têm preocupações curriculares”.
“Temos que evitar discussões do tipo “de quem é a culpa e porquê”, para unirmos forças para encontrarmos soluções”.
Em termos de abuso sexual, acrescenta, nas situações em que já há um “sofrimento significativo, mas cujos indicadores muitas vezes aparecem também noutras patologias e facilmente são confundidos”, a psicóloga afirma “normalizar” questões como, “o que é um bom e um mau toque, o que pode ajudar a despertar a consciência da criança”. “Esclarecer o que é um bom e um mau segredo também ajuda a normalizar o que a criança está a sentir”-reconhece, alertando para o facto de que quando uma situação destas se dá com “pessoas conhecidas, gera-se um conflito na criança, no qual esta se interroga de como pode contar que alguém que gosta dela, lhe está a fazer mal”, o que, a seu ver, é um conflito “muito complexo para a criança, daí ela em vez de atribuir a culpa ao agressor atribui a si mesma”. Em termos etários, diz não haver uma idade específica para a criança manifestar o abuso, existindo “diferentes formas de comunicar” a situação. “Claro que não podemos ser (estar como) policias a tentar saber tudo, apenas pretendemos desenvolver o Eu, não intrometemo-nos na vida das famílias”.
Quanto aos resultados do projecto, foram considerados “bastante positivos”, tanto pelos pais, como por educadores e professores. Lembra, ainda, que fica sempre uma possibilidade de regressar a este projecto, porque este “não morre”. No final do terceiro período, explica, terão acesso à avaliação de todos os professores que o implementaram na escola, podendo assim “perceber como cada realidade viveu e sentiu o projecto e com as recomendações e críticas de que o projecto for alvo, poderemos reformular e adaptar”.
Na mesma linha de intervenção afirma estar a desenvolver outros projectos que têm a ver com áreas de “condução promoção cognitiva”. Ou seja, são programas que permitem trabalhar competências importantes para a criança e que lhes permitem ter um melhor pensamento, e estruturarem melhor o seu raciocínio, aumentar a sua actuação atenção e concentração. Competências que estão intensamente intimamente associadas ao sucesso escolar.
Temos também o projecto do Espaço da Criança, que é bastante específico e vai de encontro às necessidades encontradas na turma do primeiro ciclo. Surgiu a necessidade de falar na morte e no divórcio, temas um pouco tabus, mas tem que se falar, ou as crianças podem arranjar as suas próprias explicações, que poderão ser patológicas.
Por seu lado, Tânia Ramos, psicóloga do serviço de Psicologia e Orientação da Escola Canto da Maia, explica-nos cada uma das etapas/ilhas do projecto. O projecto tem cinco fases de execução e uma das maiores foi “testar o estudo piloto”. A segunda fase, que tem a ver com a avaliação da primeira, passou por “inquéritos administrados aos pais, dirigentes professores e alunos”. Desta saiu um “relatório, que está disponível a todos os alunos, pais e professores”, e, sublinha, só depois de constatar que o projecto tinha “exequibilidade”, passaram para outra fase. Na quarta fase, “a educação sexual e para os afectos, deverá ser feita junto do professor, de uma forma transversal”. Numa quinta fase, os professores farão um relatório para o serviço de psicologia, para “analisar” se o projecto teve sucesso, quais as “melhorias e críticas a fazer” e, que actividades podem ser colocadas.
Como o desenvolvimento também é “progressivo”, começamos pela Ilha do Eu só meu, onde “a criança identifica-se dentro do seu próprio grupo, faz um desenho de si própria e olhando para um espelho mostra saber quem é, fala do que gosta e diz com quem vive”.
Da Ilha do Eu Só Meu passamos para a Ilha do Corpo, que é talvez a parte mais “biológica” do projecto, na qual falamos do corpo humano, dos órgãos e das suas funções. “As crianças da pré-escolar pegam num boneco, por exemplo o Ruca, e identificam as várias partes do corpo, com os termos que eles próprios utilizam. Nós adultos, vamos explicando qual o nome de cada órgão”.
Com as crianças, de cerca de 10 anos, foi sugerido assistir a um CD-ROM, que fala do corpo humano, com um pouco mais de pormenor, onde “padronizamos” os nomes dos órgãos.
Na ilha do passado, uma continuação da ilha do Corpo, falamos da “reprodução, para saberem como vieram ao mundo”. A psicóloga salienta ser necessário explicar que tem de haver um casal, uma união e, claro, “respeitando a idade e o desenvolvimento de cada criança, o que é fundamental, pois na pré-escolar não vamos entrar em pormenor. Dizemos apenas que o pai e a mão gostaram um do outro e, dai, nasceu um bebé”.
Os alunos mais velhos também assistem a um CD-ROM, que explica como se gera o embrião, o que “para eles não é nada de novo”. Apenas recordam conceitos e dão uma “abertura aos alunos para falarem em determinadas coisas que, muitas vezes, os preocupam, como a questão: de onde sai o bebé”. No caso dos mais pequenos, é pedido aos pais que colaborem “falando um pouco do passado dos filhos e enviando uma foto da criança em bebé ou de uma ecografia”. Tânia Ramos chama ainda atenção para um factor essencial, “temos que ter em atenção que podem haver crianças adoptadas ou, que não vivam com o pai ou com a mãe e pedimos só uma fotografia”. Importa, é saberem que “existiu um passado e que têm um pai e uma mãe, que podem não estar juntos neste momento, mas que gostam dela”. Na sua opinião, é um bocadinho “utópico”, enquadrar todas as crianças em cada ilha”.
Passamos para a ilha da imagem, na qual falamos na “identidade do género, o que é ser menina e menino na nossa sociedade e qual o papel de cada um”, explicando que não há mal nenhum em uma menina brincar com um carrinho. É uma questão de “gostos”. “Nesta ilha dispomos de vários bonecos, onde os alunos manifestam as suas preferências eles identificam quais são masculinos e femininos e mostramos aos pais quais os brinquedos com que eles brincam. Em idades mais avançadas, há já um debate de ideias sobre qual o papel da mulher e do homem”.
Na ilha dos Sentimentos é trabalhada a parte “emocional”, caso contrário defende que a criança não se sente bem consigo própria. “Se algo a incomoda não vamos conseguir que ela se concentre e aprenda, pois está concentrada no problema que trouxe de casa.” “Nesta, fazemos máscaras, cada uma expressando um sentimento como o da zanga, da alegria, da tristeza, surpresa, medo, entre outros. Cada criança coloca todas as máscaras e diz quando ou o que a faz sentir cada um dos sentimentos. É bom para o educador e professor concentrar-se também na questão emocional do aluno, não só na parte pedagógica e académica do aprender a ler e escrever”- sublinha.
Na Ilha das Palavras, do ‘sim’ e do ‘não’, procuram fazer uma “prevenção dos abusos sexuais através das palavras”. No pré-escolar, fazem um “teatro com fantoches, onde há um senhor mau, uma criança e um sabichão”. Surgem então, explica, várias situações, nas quais “o fantoche tenta convencer a criança do que diz e, o sabichão explica o que a criança não deve fazer e porquê”. Por exemplo: “Anda passear comigo, dou-te um gelado”. A criança aceita e o sabichão diz apenas que esta não deve ir, porque “não conhece” o senhor. Aí, as crianças aprendem que é bom dizer ‘não’, nestas situações. Em idades mais avançadas, em forma de debate, fazem com que eles percebam que “existem pessoas más na nossa sociedade, que normalmente sabem como lidar com as crianças e motivá-las”.
“As crianças aprendem que essas pessoas, podem fazer coisas que os levam a ficar desconfortáveis e que, por isso devem recorrer a alguém em quem confiar para contar a situação”-sublinha.
Segue-se a Ilha dos Outros, a ilha do positivo, onde todas “as crianças expressam o que sentem pelos colegas”. Na ilha dos Valores, todos falam de “valores, de ideias, opiniões e sobre o que é ser amigo”.
Por fim, a ilha do Tempo é uma espécie de “máquina do tempo, na qual viajam novamente por todas as ilhas”, para ver os tesouros.
A Eulândia é um projecto de “prevenção primária, que parte de um objectivo geral, onde não pensamos encontrar problemas. Podem, é haver situações em que a criança se identifique. Podemos ter crianças que, quando falamos na prevenção dos abusos sexuais, ficam mais reservadas, retraídas, mas são apenas indicadores. Não significa que seja um diagnóstico e, é importante que professores e educadores estejam atentos”.
Um outro projecto que desenvolvemos, por iniciativa própria, foi o Espaço da Criança, no qual um professor falou com os alunos sobre “o divórcio e a morte, temas que, normalmente, são tabu em casa”, conversa na qual também participou. Salienta ainda que havia crianças que “tinham o seu conceito de morte bem estruturado”, mas outras não. Relata também a história, sobre o divórcio, de uma criança de 8/9 anos que estava a passar por isso e estava a “sofrer bastante, de tal forma que se fechou ao grupo”. Depois de lhe explicar que “as famílias mudam”, por vezes, o pai e a mãe percebem que não é bom estarem juntos, resolvendo afastar-se, mas não deixam de gostar dos seus filhos. “Tivemos uma conversa simples, fizemos desenhos sobre o assunto e explicamos que, numa situação destas, a criança precisa da ajuda dos colegas. No dia seguinte o aluno já parecia outro, já brincava, sorria e confiava mais” no outro.
Alice Oliveira, educadora da sala dos 3 /4 anos do Infantário de Ponta Delgada, afirma que a reacção das crianças, foi “muito boa. Eles foram muito espontâneos e interessados, fizeram bem a viagem, estiveram muito atentos e gostaram”.
António Barreto, professor da turma piloto do primeiro ciclo da escola Canto da Maia, considera o projecto “enriquecedor” para todos os envolvidos. Os resultados, afirma terem sido “muito positivos, mesmo para as crianças que não falam nestes assuntos com os encarregados de educação”.
Por parte dos alunos, das salas dos 3 a 4 e, 5 anos que dizem ter gostado “muito” do projecto, as ilhas mais apreciadas foram a dos Sentimentos, a das Palavras, a dos Valores e a dos Outros.
É bom para o educador e professor concentrar-se,
Também, na questão emocional do aluno,
não só na parte pedagógica e académica
do aprender a ler e escrever.
No caso de…
da Psicóloga Tânia Ramos

Uma criança que tenha sido vítima de abusos sexuais, pode deixar de comer, ficar apática e depressiva, não dormir bem e tornar-se reservada, mas isto são apenas indicadores que podem, ou não, levar a um diagnóstico. Os próprios desenhos que ela faz podem demonstrar isso, ou não, mas é importante perceber que o abuso sexual, por vezes, não é entendido como tal para a criança. É muito difícil precisar quais os elementos num desenho, que demonstram esta situação. Por exemplo, existe a ideia de que o preto significa algo de mau, mas a criança pode apenas estar na fase de gostar de preto. Também já aconteceu esta desenhar o acto em si ou criança desenhar o órgão sexual mais explícito, mas temos de contextualizar o desenho e lembrarmo-nos de que a criança está na fase de descoberta do corpo e pode achar engraçado desenhá-lo.
Pode parecer estranho, mas, muitas vezes, quando a criança tem uma relação muito boa com um amigo ou vizinho, que a ajuda em tudo e vai, devagarinho, manipulando toda a relação, esta já desenvolveu uma relação muito forte com essa pessoa e pode ainda não ter interiorizado que está sujeita a uma situação grave, porque não a viu como grave. Poderá, sim, ver a situação como grave, quando começar a sentir um certo mal-estar. Imaginemos, que este adulto nunca usou de violência! Aí, a criança não está consciencializada da gravidade da situação, vendo-o apenas como um adulto que a cativou, que gosta dela e que a está ajudar. Por isso, é muito complicado chegarmos a um diagnóstico de abusos sexuais, pois por mais indicadores que a criança nos possa dar, por vezes há um que falha. Só quando a criança interioriza que foi um abuso, é que se sente mais confortável para falar. Por outro lado, muitas vezes, só anos depois é que a criança se apercebe do que aconteceu.

Raquel Moreira
Public in Terra nostra, Maio de 2008.

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