sexta-feira, 25 de julho de 2008

Apostar no turista "português"


Encontro Internacional de Turismo


Os Açores são uma Região com “enormes” potencialidades em termos turísticos. O que existe é uma “falta de enfoque”, pois a sociedade portuguesa toda a vida deu “mais valor ao estrangeiro, do que ao português, mas há cinco milhões de portugueses” no estrangeiro, o melhor cliente que a Região pode ter. É preciso “mudar as mentalidades”.
Segundo Carlos Morais, presidente da Comissão do Encontro Internacional de Turismo, a realizar em Ponta Delgada, é essencial “dar a conhecer os Açores a agentes turísticos e medidores de opinião”, que depois os divulguem nos seus países.

Os Açores foram o destino escolhido para a edição deste ano do Encontro Internacional de Turismo, a realizar entre 28 de Setembro e 1 de Outubro. A iniciativa conta já com 14 anos de vida e tem como objectivo dar a conhecer destinos diferentes a agentes de viagens, medidores de opinião e alguns clientes, que visitam o local tentando conhecê-lo ao máximo para, posteriormente, o divulgarem nos países onde residem. O turista geracional é o que mais convém à Região.
Carlos Morais, presidente da Comissão do Encontro Internacional de Turismo (EIT), começa por dizer que esta iniciativa, criada em 1995, comemora em breve 14 anos de existência e todos os anos “elege uma Região de Portugal à qual leva cerca de 100 a 150 participantes de todo o mundo, agentes de viagens, clientes e medidores de opinião, que a vêm conhecer para poderem divulgá-la no estrangeiro, junto dos seus países”.
No passado, visitaram a Madeira, o Algarve, Lisboa, Costa do Estoril e Cascais, Setúbal, Coimbra, Porto e Douro e; Serra da Estrela. Este ano conforme durante muitos anos, revela, foi “desejo dos agentes de viagens”, virão conhecer os Açores, arquipélago que considera ser “uma pérola no meio do Atlântico e que é preciso dar a conhecer aos agentes de viagens de língua portuguesa” residentes no estrangeiro.
O paradigma, critica, é que “há em todo o mundo 550 agências de viagens propriedade de portugueses, que empregam cerca de seis mil pessoas, que, diariamente, vendem turisticamente os vários destinos e embora sejam portugueses, nunca foram integrados nos ‘funtreap’ de conhecer turisticamente os Açores”. Isto, porque, argumenta, têm o “azar” de serem portugueses, o que em vez de ser uma vantagem faz que sejam “rejeitados” pelas actividades normais, que se dá a todos os estrangeiros, situação que acontece tanto na industria como no turismo – lamenta, avançando que o que estes agentes de viagens, lideres de opinião e alguns dos clientes querem é ter “o mesmo conhecimento”, que os demais profissionais de turismo.
“Vamos conhecer as Furnas, onde degustaremos o típico cozido, conhecer os hotéis mais emblemáticos, visitar a zona do chá, dos ananases, estar em contacto com a beleza típica das Sete Cidades, os campos de Golfe e, como não podia deixar de ser, vamos conhecer com todo o pormenor a cidade com os novos desenvolvimentos à volta da zona principal do porto e da marina, que são os grandes projectos”- relata, referindo-se ao programa do evento, que prevê obter também um “melhor conhecimento da oferta turística das unidades hoteleiras”, de que hoje os Açores dispõem.
O objectivo é sobretudo “dar a conhecer a Região aos agentes de viagens e clientes, que vem dos Estados Unidos, Canadá, Venezuela, Brasil, Suíça, França e até de Cabo Verde e de outros países para conhecer os Açores”.
Carlos Morais reconhece ainda que, actualmente, “o mais difícil é trazer turistas de língua portuguesa dos Estados Unidos, Canadá ou de França e o mais fácil é levá-los do Porto até aos Açores”. E, por incrível que pareça, comenta insatisfeito, não foi feita até hoje uma promoção “forte”, junto deste mercado, que representa “5 mil milhões de turistas que estão em média em Portugal, mais de 20 dias” por ano.
Os turistas “vêm, investem, consomem, promovem e repetem” e são, de facto, dos turistas mais “fiéis, pois consomem elevados valores na Restauração e investem no resto do país”. É necessário “olhar para os Açores como um destino” e dar a conhecer a todos, aquilo de facto, hoje, são os Açores.
Trata-se de uma Região com “enormes” potencialidades em termos turísticos. Na sua opinião, o que existe, sublinha, é uma “falta de enfoque”, pois a sociedade portuguesa toda a vida deu “mais valor ao estrangeiro, do que ao seu português, mas há cinco milhões de portugueses que estão lá fora e há cada vez mais emigração”.
Além disso, salienta, são muitos os portugueses que vão para o estrangeiro e “mal têm algum poder económico, a primeira coisa que fazem é tentar conhecer o seu país de origem”. E é “muito mais fácil”, alerta, “dinamizar e proteger turisticamente” Portugal e os Açores em concreto, junto dos cidadãos de língua portuguesa que estão lá fora, do que estar “eternamente” a buscar um sueco, dinamarquês, norueguês, alemão ou americano, que visita uma vez a Região e não volta mais. Carlos Morais ressalva ainda que este turista português “elege os destinos e volta com a família”, de forma continuada, por estes motivos é essencial “descobrir” qual o melhor cliente, em vez de fazer publicidade “apenas nos destinos e mercados habituais”. Se calhar, enfatiza, o que se tem de fazer é “rever os destinatários” da acção turística e da promoção.
Obviamente, que se trata de um turista com “poder económico” e que só visita os Açores, ou outros destinos, se estes tiverem um “factor preferencial positivo”, não estando disponível a ser o tal “turista de massas”. É, sim, um turista que realmente “prefere a diferença, não se importa de apanhar um bocadinho de mau tempo, mas acima de tudo dá valor à atitude peculiar, à tradição e à manutenção das formas de vida antigas”, embora modernizadas e já com novos meios de sobrevivência da sociedade moderna. Este turista valoriza o “equilíbrio fundamental existente entre o moderno e a preservação da tradição” e, lembra, é nisso que os Açores de facto têm feito uma aposta de alguma forma “bem conseguida” e tem todas as condições para isso. “A Região apenas tem de se dirigir aos turistas com melhor potencial de valorizarem este esforço que os Açores têm feito”- acentua.
Questionado sobre a questão dos transportes aéreos e os preços praticados, afirma ser outra área “fundamental”, sendo necessário “disponibilizar” o transporte aéreo para este tipo de turista. “São turistas com particularidades e não há nos voos regulares estratégias habilitadas, capazes de responder às especificidades do mercado”- lamenta, acrescentando não haverem “programas para jovens luso-descendentes visitarem regularmente Portugal, nem para seniores”. Este mercado tem uma “sazonalidade muito grande”, situação que considera ser necessário “inverter”. Para isso, a promoção feita no estrangeiro, é preciso fazê-la “também junto do cidadão português que lá reside”.
Quanto a evitar atrasos e prestar a devida assistência em viagem, afirma serem factores essenciais, pois hoje “ninguém viaja sem qualidade”. Um turista compra uma viagem de avião e não tendo um tratamento célere da bagagem, por exemplo, sente-se “defraudado”, naquilo que é actualmente um turista “mais ocidental”, que existe hoje por todo o mundo.
Referindo-se ao terminal de cruzeiros e ao futuro casino, o empresário avança serem outra vertente destinada a outro tipo de turista, a que os Açores têm estado “aliados” e que têm condições de “recuperar”. Isto, pois nas famosas viagens transatlânticas, os cruzeiros precisam de “pousos com características e condições adequadas”.
Logicamente, que se os barcos existem, também existem turistas (e um destino), agora resta “criar as condições para que as duas realidades se juntem”. Carlos Morais argumenta ainda que o mercado já existe, o que os Açores não tinham era “condições para poderem receber esse tipo de turistas de cruzeiros”. Estamos perante um turista que, apesar de ter “defeitos”, como o não dormir em terra, não utilizando a cama, dispõe também de uma grande vantagem. Eles “promovem, divulgam e massificam o conhecimento, divulgando o destino Açores”, para além do chamado turista tradicional que já vinha aos Açores.
Na sua opinião, “ninguém vai fugir por ver o casino”. Pelo contrário, este irá, “atrair outro tipo de turistas”, que por terem um casino se sentirão mais motivados para visitar os Açores. Além disso, a par de outros destinos turísticos, o facto de não haver casino pode ser uma “perda” e, o dia em que este estiver activo constituirá um “ganho qualitativo na oferta turística” dos Açores.
Questionado sobre o tipo de turista que convém aos Açores, avança no seu entender tratar-se do “turista geracional que vem e volta com a família e, mais tarde, com os amigos”. E no seu regresso, salienta, vem sempre numa óptica de “valorizar a tradição e o é genuína e turisticamente” os Açores.
Quanto ao que poderá ser feito para desenvolver mais a Região em termos turísticos, afirma ser importante “dotar os agricultores de meios económico”, capazes de melhorar a forma como vivem, porque os Açores turisticamente precisam desta realidade e o turista “preserva, valoriza e paga, porque quer identificar nos Açores esse valor da tradição”- enfatiza.
“Há que fazer uma aposta, valorizando aquilo que é genuinamente característico dos Açores, mas a maior dificuldade neste projecto, está em apostarem erradamente em turistas, que só vêm por preços baratos ou à procura de um produto similar aos dos outros países”- esclarece, avançando que a “grande aposta” está em descobrir este tipo de turistas “não se esgota”, pois trata-se de um turista “geracional” com origens portuguesas em todo o mundo. O turista que vem à procura de preços baixos, alerta, “não é, certamente, o turista que no futuro se repete” a visitar os Açores.
Em termos de projectos, o presidente explica que todos os anos promovem, em parceria com o governo regional, a área “agro-alimentar dos Açores no mundo inteiro”, vertente de enorme sucesso e que está relacionada com a presença anual dos produtos açorianos na maior feira que há anualmente, em Lisboa, de produtos alimentares.
O Encontro Internacional de Turismo é promovido pela Comissão Organizadora, pela Mundinvent, jornal “O Emigrante” e por um conjunto de entidades das comunidades, que se associam através das suas próprias agências de viagens. A nível local, o apoio vem da Direcção Regional de Turismo e da Secretaria Regional da Economia.
Como última mensagem a passar aos açorianos e aos profissionais de turismo, Carlos Morais aproveita para dizer que os Açores são “uma pérola com um potencial imenso e um capital de simpatia”, que as pessoas quando falam na Região falam com “carinho”, realidades que é essencial “transformar” em potencial turístico.
Acima de tudo, evidencia, é necessário “mudar a mentalidade” das pessoas, para que estas “valorizem a importância do turista português residente no estrangeiro”. Não é somente o açoriano residente no estrangeiro, alerta, mas o madeirense, o minhoto, o alentejano. “São cinco milhares e há que, de uma vez por todas, que dar valor ao que é português. Não vale a pena exigir que os outros nos dêem valor, se nós próprios não o fizermos”-conclui.


Raquel Moreira
Public in Terra Nostra, Julho de 2008

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